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O receio de perder o direito de pertença à comunidade de origem sefardita fez com que o odontólogo Pedro Henrique de Souza Lopes, 35, antecipasse a solicitação de cidadania portuguesa junto ao governo lusitano. Descendente de judeus sefarditas, o potiguar, que atualmente vive em Pernambuco com a família, decidiu ingressar com o pedido antes de setembro, quando novas regras da nacionalidade entram em vigor, em Portugal.  

Em março, o governo português publicou regulamento que endurece as exigências para os descendentes de sefarditas, que, a partir de 1º de setembro, terão de comprovar vínculos efetivos com o país, como viagens, heranças e participações em sociedades. Apreensivo com as exigências, Pedro diz que não tem herança e viagens frequentes a Portugal até porque seus ascendentes foram expulsos de suas casas. 

Ao lado do irmão, João Paulo de Souza Lopes, 27, que é administrador de empresas, solicitou apoio de uma consultoria internacional para a organização dos dados e ingresso junto à Conservatória em Lisboa. Com o anúncio das alterações no regulamento da lei de nacionalidade, que aconteceu em fevereiro, o advogado e CEO da Martins Castro, Renato Martins, diz que houve aumento considerável na procura por assessoria para nacionalidade sefardita. 

Entre março e maio, os pedidos cresceram 30% e a tendência é de que a alta se acentue nos próximos meses. Ele comenta que tem recebido diversas mensagens de pessoas que acreditam que a lei foi revogada e que não há mais tempo para a solicitação, o que não é correto. 

De acordo com o advogado e especialista em Direito Internacional Privado, Thiago Huver, o acesso à cidadania portuguesa por essa via ficou muito mais restrito, mas não vai acabar. “Recomendamos que as pessoas busquem dados oficiais e assessoria profissional para organizar suas pesquisas genealógicas e os processos judiciais em tempo hábil, visto que as mudanças ao regulamento para este tipo de cidadania começam a valer a partir de 1º de setembro deste ano.”

Pedro Henrique afirma que a obtenção deste reconhecimento é mais do que a emissão de um título de cidadania. “É um reconhecimento de tudo que Portugal fez a toda comunidade judaica na época da inquisição, uma reparação por tudo que nossos ancestrais passaram, tentaram nos apagar da face da Terra. Por isso, é muito importante e faz muito sentido para a nossa família e é motivo de orgulho muito grande”. 

O odontólogo diz que, assim como ele, outros três primos, Wilson, Victor e Dominique, também devem ingressar com as solicitações da cidadania portuguesa em breve. Em sua família há cerca de 50 descendentes de judeus sefarditas, com sobrenomes Lopes, Maia e Veríssimo. Resultado de uma história que começa no século XVI quando judeus sob fuga da inquisição vieram para o Brasil e parte destas famílias se instalaram no interior do Ceará, onde iniciaram atividades de agropecuária e comércio para a subsistência.

A descoberta foi possível graças a uma pesquisa genealógica feita pelo historiador Franzé Lopes, que mapeou até a 15ª geração de ancestrais e deu origem ao livro Resgate – A Origem. Futuramente, ele também pretende solicitar a dupla nacionalidade. Para o historiador, a legislação portuguesa, ao garantir o direito à cidadania aos sefarditas, reconhece que algo que foi retirado à força dos judeus e agora permite uma reparação e justiça para as atuais e futuras gerações. 

O advogado Renato Martins avalia que os novos requisitos previstos no regulamento da Lei da Nacionalidade irão restringir a restauração da nacionalidade aos descendentes sefarditas. Para o advogado, ao exigir herança de bens e vínculo atual com Portugal, o regulamento retira o fundamento restaurativo da lei. “Como é possível exigir herança de bens imóveis para os descendentes sefarditas se o próprio estado português confiscou os títulos de propriedade dos judeus à época? Como se exigir viagens regulares ao longo da vida ao país em que sua família foi expulsa e perseguida?”, comentou. 

Segundo ele, após setembro, discutir a constitucionalidade dos novos requisitos pode ser um caminho para que a lei sefardita cumpra seu papel restaurador, assim como orientar os novos requerentes a documentar a ligação efetiva a Portugal, para, assim, satisfazer os novos requisitos.